Olá, leitores. Começando hoje uma sequência de textos sobre as
transformações a que está sujeita a mulher na gravidez e as possíveis
consequências negativas quando as coisas não saem exatamente como planejadas.
Boa leitura!
Frequentemente, a gestação é
encarada como um período transformador na vida de uma mulher. Além de ser um
momento “mágico”, através do qual um
novo ser penetrará na vivência familiar, a gravidez é socialmente identificada
como um período positivo. É a vida que se recicla! É uma oportunidade de
reeditar experiências negativas do passado... É a hora de renascer junto da
criança que chega. Contudo, seria sempre assim, em todas as situações, uma experiência
exclusivamente de harmonia e paz?
Observando mais cautelosamente esse
fenômeno, é inegável que as múltiplas transformações biopsicossociais que
ocorrem com a mulher durante o gestar chegam de forma avassaladora,
principalmente para as primigestas*. As diversas transformações
no peso, na aparência, na pele e na locomoção (só para citar algumas) andarão
lado a lado com ebulições psíquicas. Ser uma boa mãe (ou uma “mãe
suficientemente boa”, como diria Winicott1), ou ainda lidar com as
pressões de familiares e amigos (sempre com algo a opinar), são algumas das
demandas que o processo de maternagem carrega na vida ocidental contemporânea.
A relação com o bebê, cada vez mais forte e mais “vivo” para a mulher, é uma
faceta crucial da evolução da gravidez. Os movimentos fetais, por exemplo, são
relatados na literatura (Maldonado, 2017)2 como uma experiência
atrelada à concretização da gestação – vinculada
ao sentimento de “tornar-se” grávida. Sentir o bebê mexendo é como se ele estivesse
vivo para a mãe (de fato!). Vale salientar, todavia, que essa transformação,
essa aceitação da maternidade, acontece paulatinamente... Isso, por si só, deve
trazer tranquilidade à mulher gestante.
Será aos poucos que ela transitará de um estado “não-mãe” para um estado “mãe”.
Ninguém nasce sabendo de tudo.
É bem pertinente também, leitor,
relembrar que esse é o período da vida em que elas, as futuras mães, passarão
por profundas mudanças hormonais. Trata-se da elevação do estrógeno e da
progesterona, substâncias que manterão a gravidez (“pro-gesterona” =
“pró-gestar”). Além da modulação de outras substâncias, como o cortisol e
outros glicocorticoides, responsáveis pela cascata de resposta ao estresse. E
todos esses hormônios terão atuação a nível cerebral, onde por meio de
receptores estarão ativando ou inibindo comportamentos. Desregulações nesse
modelo hormonal explica - juntamente com fatores como apoio do cônjuge,
situação socioeconômica e antecedentes psiquiátricos – por que algumas mulheres
desenvolvem problemas psiquiátricos no puerpério*.
A depressão é um exemplo clássico de acometimento mental no pós-parto e pode
atingir uma média de 20% das brasileiras3 (falaremos mais sobre isso
no próximo texto).
Tateando por essa teia biológica,
psicológica e social, a mulher terá muitas chances de tropeçar. É uma caminhada
bela, poética e maravilhosa. Não obstante, difícil em todos os níveis. Diversas
defesas psíquicas terão que ser levantadas para sustentar a mente nesse milagre
da vida – inclusive aquelas que farão a mulher entrar em contato (ou não) com
sua própria experiência de nascer e de ser criança.
Sei que para você talvez tudo
isso pareça um pouco abstrato, mas gostaria de introduzir esse tema por esse
viés antes de entrarmos na depressão no puerpério (ou no periparto*) propriamente dita. Continue com nossas postagens para
saber mais sobre o tema.
* Puerpério: período
que ocorre logo após o parto, também denominado de pós-parto.
* primigestas:
mulheres passando pela primeira gestação
* periparto:
conceitualmente, o período antes, durante e após o parto
REFERÊNCIAS:
1.
Zimerman, D. E. Fundamentos psicanalíticos: teoria, técnica e clínica: uma
abordagem didática. Porto Alegre: Artmed, 2007.
2.
Maldonado, M. T. Psicologia da Gravidez: gestando pessoas para uma sociedade melhor.
2ª edição. São Paulo: Editora Ideias e Letras, 2017.
3.
HARTMANN JM, MENDOZA-SASSI RA, CESAR JA.
Depressão entre puérperas: prevalência e fatores associados. Cadernos de
saúde pública, v. 33, n. 9, p. 1-10, 2017.

Muito edificante esse artigo! Gostaria de continuar aprendendo, especialmente sobre as mudanças hormonais que justificam esse turbilhão de emoções deste período e também como ocorre numa segunda gestação.
ResponderExcluirQue bom que gostou! Continua nos acompanhando, pois teremos uma série bastante proveitosa!
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